Intellèctus

 

Vol. 17, núm. 1 (2018).

Dossier: “A imprensa negra e sua intelectualidade”

 

Desde as últimas décadas do século XX a imprensa se transformou em importante objeto da pesquisa histórica. Mais do que um repositório de informações jornalísticas sobre o passado, camufladas sob o rótulo da “neutralidade” forjada ainda no século XIX, ela passou a ser entendida como espaço fundamental de batalhas políticas e sociais, simbólicas e discursivas. Intelectuais, jornalistas, literatos e tantos outros escritores fizeram das páginas dos jornais instrumentos de reflexão, intervenção e transformação social, nas quais se publicavam projetos de sociedade e de nação. Nesse sentido, o objetivo deste dossiê se confunde, em grande medida, com o perfil da própria revista em que ele é publicado. No entanto, se há tempos os jornais se consolidaram como objetos passíveis de investigação histórica, somente em anos mais recentes o estudo da imprensa negra –jornais produzidos por pessoas negras e para pessoas negras, em sua maioria, veiculando assuntos de interesse das populações negras em diálogo com a sociedade como um todo – tem se tornado mais sistemático e ampliado na historiografia. Resultado da atuação grupos e indivíduos, em diferentes temporalidades, que investiram na produção de discursos que confrontavam, entre outras coisas, situações de discriminação, a imprensa negra se transformou em lócus privilegiado para o estudo sobre a forma como homens e mulheres refletiram e se expressaram sobre o mundo no qual estavam inseridos. Uma vez que o preconceito de cor, o ódio de raça ou o racismo são elementos constitutivos das sociedades fundadas na escravidão de africanos e seus descendentes, as páginas desses jornais evidenciam não só as trajetórias de vida dos muitos escritores, intelectuais, jornalistas e poetas negros, como trazem à tona as lutas e os enfrentamentos contra o preconceito racial, as batalhas por cidadania e direitos e as redes de sociabilidade e solidariedade que se formaram. Há no Brasil um vasto material disponível em arquivos públicos e acervos particulares que oferecem múltiplas possibilidades de reconhecimento e análise da produção intelectual de pessoas de ascendência africana falando na primeira pessoa, seja a do singular ou a do plural. Vozes que estão ganhando as páginas de estudos produzidos em diferentes instituições de pesquisa no Brasil e no exterior. O presente dossiê buscou reunir alguns desses trabalhos, priorizando a diversidade não só regional, quanto temática e metodológica presentes nos estudos da imprensa negra.

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Índice

Dossiê: A imprensa negra e sua intelectualidade

Apresentação, por Ana Flávia Cernic Ramos e Ana Flávia Magalhães Pinto

Autodesignaciones de las y los afrouruguayos en su prensa (1872-1952), por Mónica García

O Exemplo, a imprensa e os homens “de cor” em Porto Alegre no pós-abolição, por Melina Kleinert Perussatto

Os homens de cor invisíveis da imprensa negra paulistana: como a biografia de um intelectual negro nascido no século dezenove auxilia a repensar a historiografia do pós-abolição paulistano, por Lívia Maria Tiede

Transgredindo as margens e forjando histórias: a imprensa negra na fronteira Brasil-Uruguai no Pós-Abolição, por Fernanda Oliveira da Silva

O Jornal Quilombo, Abdias Nascimento, e o Ativismo dos Direitos Humanos no Brasil, por Niyi Afolabi

Histórias em negrito: uma entrevista com a Dra. Martha Rosa Figueira Queiroz, por Ana Flávia Magalhães Pinto e Ana Flávia Cernic Ramos

 

Artigos Livres

Modinha: Um estudo etimológico sobre o termo, por José Fernando Saroba Monteiro

A República Lusitana das Letras: um retrato das redes de comunicação dos jornais emigrados no início do século XIX, por Luis Francisco Munaro

Apontamentos sobre Bernardo Élis biógrafo (1973-1980), por Albertina Vicentini Assumpção e Gabriel de Paula